quarta-feira, 9 de março de 2011

NÓS DOIS

A gente parecia ter poucas coisas em comum, na vida prática. Nos encontramos em uma das poucas ocasiões de semelhança. Ele havia construído uma vida com valores e princípios iguais aos meus, mas a direção dos seus dias acontecia de forma diferente. Ele era dotado de uma ingenuidade quase inacreditável. Eu havia aprendido a ler nas entrelinhas, a acreditar num certo determinismo psíquico e a aceitar que nada na vida acontece desprovido de intenção. Não me tornei uma pessoa dura, muito pelo contrário. Mas já conseguia separar o joio do trigo com uma estatística de acertos digna de ser levada em consideração. E isso, hoje sei, não é lá um mérito muito grande.


Ele teve que se tornar uma pessoa do mundo, como forma de autopreservação. Foi o caminho que escolheu e - provavelmente - a forma mais saudável de manter o seu self equilibrado. Tornou-se, assim, uma pessoa querida pelas mais diversas razões. Muitas certas, outras tantas não tão honestas. Esteve sempre rodeado de poucos grandes amigos, irmãos que a vida lhe trouxe, milhares de colegas circunstanciais, pseudo-amigos conquistados em festas e baladas, sugadores de imagem... Essa última, para mim, a espécie mais digna de pena. Porque era bacana ser querido (a) por ele. Porque ele tinha muitos amigos. Porque tinha uma vida movimentada. Porque é lindo em todas as dimensões. Porque a sua condição profissional dá status de uma forma torta, para os pouco alimentados de si mesmo.

Eu me tornei uma pessoa mais introspectiva. Aprendi a analisar quase que reflexamente. Com amigos, de verdade, de um perfil determinado. De características diversificadas, é verdade. Mas seguindo a lógica de que as semelhanças unem as pessoas. Não que não tenha me deparado com colegas de balada, amigos circunstanciais ou sugadores de imagem. Sim, muitas vezes os encontrei pelo caminho. Mas nunca os rotulei de amigo por achar que era esse o papel deles na minha vida. Faltava-me ingenuidade. Ou talvez, a vida tenha me ensinado a definir quem é quem, no jogo do bicho. Acho que o meu conceito de intimidade era um pouco diferente... Porque poucas pessoas se apropriavam da minha vida. Porque sempre me resguardei de ser a grande notícia ou o centro das atenções. Dei um valor muito grande a preservação da minha imagem e nunca soube dizer, ao certo, se esse é o melhor caminho. Mas sempre fui muito crítica comigo mesma, para correr o risco de ser julgada por quem não me conhecia, de fato. Talvez essa, também tenha sido uma maneira de me defender. Também não sei, se a mais correta...


Mas a gente se encontrou, mesmo assim. Porque talvez, por ser diferente do que ele estava acostumado, eu fosse o que ele procurava, de verdade. Porque, talvez, eu tenha conseguido lhe direcionar sentimentos desprovidos de intenções tortas. Porque talvez, comigo, ele tenha conseguido entender um pouco mais de si mesmo, no que tem de mais íntimo. Quem sabe, porque eu tenha feito ele enxergar determinadas coisas com outros olhos. E ele tenha gostado do novo, que encontrou nele.

E a gente se encontrou assim... Porque, certamente, ele me direciona um sentimento nunca antes sentido. Porque ele me faz entrar em contato com dezenas de fraquezas minhas, fantasiadas de teorias e certezas. Porque a simplicidade com que ele vive os seus dias, torna-os incrivelmente leves. Porque eu o admiro por um monte de coisas que me angustiam, numa relação bem contraditória, mas motivadora de mudanças importantes, que talvez eu precise enfrentar. Porque ele me leva a questionar um monte de comportamentos. Talvez, porque ele seja o que nunca pensei para mim, mas o que mais me faz feliz. Porque ele me dá a segurança de um amor intenso. Porque eu o amo com o amor mais inédito e mais exclusivo do meu arsenal de sentimentos. E com ele, ando numa necessidade constante de limpar a chaminé, como numa sessão de psicoterapia perene. Como se isso fosse parte importante no meu processo de ser feliz de forma segura. Que às vezes dói. Às vezes angustia. Mas que sei ser imprescindível para que eu me deixe ser amada simplesmente pelo que sou. Sim, porque é assim que ele me ama. Descabelada, surtada, irritada, nos meus maiores momentos de imperfeição. E isso, para mim, talvez seja uma gostosa e assustadora novidade. Porque ele me leva a querer ser uma pessoa melhor...

E a gente se encontrou pelo mais simples motivo. Eu poderia dizer que foi porque nossos valores são iguais, nossos princípios são da mesma família. Porque a gente provocou um processo de amadurecimento mútuo. Porque a gente gosta da companhia do outro em qualquer programa e fazendo nada. Porque o outro é o nosso porto-seguro, nosso alicerce, nossa vida. Mas na verdade, considerando tudo isso, a gente se encontrou porque somos pessoas cheias de sorte e a vida deve gostar um tantão da gente. Porque amor assim, que só acontece uma vez na vida, não se explica. Não se define. Acontece, e pronto. E a gente tem que aproveitá-lo diariamente, da forma mais intensa e mais justa possível: amando, cuidado, merecendo e agradecendo.

Um comentário:

  1. Você como sempre magnânima em suas palavras e tão certeira na descrição de sentimentos, impressionante...

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